Minha tese foi premiada

No dia do aniversário de 84 anos da minha querida PUC-Rio recebi o prêmio dado pelo Centro de Teologia e Ciências Humanas à minha tese. O prêmio destaca uma tese de cada um dos departamentos do centro, do qual faz parte o Departamento de Educação.

Conhecendo tantos trabalhos incríveis feitos por colegas super competentes que estiveram comigo nessa caminhada, esse prêmio adquire um valor ainda maior. Aliás, eu devo muito – não apenas aos professores e, claro, ao meu orientador querido, Ralph Bannell – mas a todos os meus colegas incríveis que me incentivaram e me apoiam até hoje. Parabéns a todos nós que trabalhamos para melhorar a educação a cada ano, a cada semana e a cada dia!

O prêmio disponibiliza as teses premiadas na forma de ebooks. Essa edição laranjinha nas minhas mãos é uma impressão do ebook da minha tese, que pode ser conferido aqui.

Obrigada PUC-Rio, obrigada amigos que a PUC me deu e obrigada @edupucrio pelo reconhecimento. ✨⭐️

What Computers Can’t Do (Hubert Dreyfus)

EN

Hubert Dreyfus’ “What computers Can’t Do” will be 50 years old in 2022. Despite having been released half a century ago, it is still pertaining when it comes to the gap between human cognition and artificial intelligence. I like Dreyfus’ critique to artificial reason mostly because he was actually concerned with human intelligence, not so much machines’ intelligence. The book (which got a second edition, amplified, in 1992) is compelling for those interested in comprehending some of the most important challenges faced by AI – and that have not yet been overcome.

Inspired by phenomenologists like Heidegger and Merleau-Ponty, Dreyfus (who unfortunately died in 2017 at 87) advocated that human intelligence is far beyond computation and representation. He suggested that we are “skillful copers”, i.e., highly skilled embodied agents capable of dealing with the world’s uncertainties and unsteadiness in a remarkably fine-grained way, anchored in the body and in the emotions. Because it is coupled to the environment, this being-in-the-world is more direct and less dependent on mediators (representations).

I also encourage readers to watch some of Dreyfus’ great interviews, lectures and talks available online.

PT

Hubert Dreyfus’ “What computers Can’t Do” fará 50 anos em 2022. Apesar de ter sido lançado há meio século, ele ainda é pertinente quando se trata do gap entre a cognição humana e a inteligência artificial. Eu gosto da crítica de Dreyfus à razão artificial principalmente porque ele estava realmente preocupado com a inteligência humana, não tanto com a inteligência das máquinas. O livro (que teve uma segunda edição, ampliada, em 1992) é muito pertinente para aqueles interessados em compreender alguns dos desafios mais importantes enfrentados pela IA – e que ainda não foram superados.

Inspirado por fenomenólogos como Heidegger e Merleau-Ponty, Dreyfus (que infelizmente morreu em 2017 aos 87 anos) defendeu que a inteligência humana está muito além da computação e da representação. Ele sugeriu que somos “skillful copers”, isto é, agentes corporificados altamente habilidosos capazes de lidar com as incertezas e instabilidades do mundo de uma forma altamente refinada, ancorada no corpo e nas emoções. Por estar acoplado ao meio ambiente, este being-in-the-world é mais direto e menos dependente de mediadores (representações).

Eu também encorajo os leitores a assistir algumas das grandes entrevistas e palestras da Dreyfus disponíveis on-line.

Hubert Dreyfus on Embodiment (II-II)
Conversations with History: Hubert Dreyfus
Hubert Dreyfus Interview – AI, Heidegger, Meaning in the Modern World

Filosofia: uma introdução temática (Giovanni Rolla)

O livro “Filosofia: uma introdução temática” foi publicado recentemente pelo professor e pesquisador Giovanni Rolla, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), inaugurando uma coleção vinculada ao Nel – Núcleo de Epistemologia e Lógica da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Está disponível como e-book e pode ser baixado gratuitamente neste link aqui.

Em 2018, o professor publicou “Epistemologia: uma introdução elementar”, também disponível gratuitamente neste outro link aqui. Impulsionado pela boa experiência anterior, desta vez o autor teve como motivação desenvolver uma obra que apresentasse problemas filosóficos a leitores interessados em filosofia, não necessariamente iniciados no campo.

Para escrever essa introdução, Giovanni Rolla partiu de suas próprias aulas, ainda que sem se limitar a elas. O resultado é um livro de grande utilidade prática para a compreensão de determinadas ideias a partir da perspectiva da filosofia. Em parte, a originalidade da obra se deve à própria maneira como as ideias são expostas, com leveza, objetividade e foco nos problemas filosóficos. Giovanni escreve de uma forma muito fluida, agradável e acessível.

A importância de um livro escrito dessa maneira para quem se interessa por filosofia, mas ainda não tem muita familiaridade com a área ou conhecimento prévio, é que começar a ler filosofia nem sempre é uma tarefa muito fácil. Uma prática comum na área é a exegese, além da investigação histórica. O problema é que essas práticas, em vez de atrair, podem acabar distanciando interessados em filosofia que não têm tempo ou fôlego para uma leitura tão minuciosa daquilo que cada autor falou e em qual contexto.

Um tanto mais rara no Brasil e, no meu entendimento, possivelmente mais proveitosa – especialmente para quem deseja contar com a filosofia para ampliar sua perspectiva acerca de determinados assuntos – é a apresentação de tópicos como Giovanni faz. Essa proposta torna o livro um interessante ponto de partida (daí o nome da coleção que a obra inaugura) para discussões que apresentam interseções com outras diversas áreas.

Na breve entrevista que fiz com o autor, ele conta um pouco mais:

1. Qual você considera que é o “público-alvo” do livro?

GIOVANNI ROLLA: Eu concebi esse livro aproximadamente a partir das minhas aulas de Introdução à Filosofia na UFBA. Essas aulas são voltadas para alunos de outros cursos que não a Filosofia, como os cursos de Direito, Psicologia, Bacharelado Interdisciplinar, Administração, Secretariado Executivo entre outros. São pessoas que ainda não tiveram muito contato com assuntos e temas filosóficos—se estudaram Filosofia, foi com o enfoque tradicional do ensino médio, que, na maior parte das escolas, é voltado para o ENEM. Então eu escrevi para esse tipo público (mas acredito que também possa ser usado, junto com outro material, no ensino médio). Ou seja, escrevi sem pressupor conhecimento de discussões filosóficas, e procurei apresentá-las com o vocabulário mais acessível possível, dentro de um recorte bem delimitado e com algumas sugestões de leitura no fim dos capítulos. Inclusive, são muitas vezes as leituras que eu uso em sala de aula.

2. A filosofia tem fama de ‘complicada’ e você, além de contribuir com o livro em si trazendo uma introdução a temas importantes da área, se mostra bastante preocupado com a linguagem que utiliza no livro, de um modo bastante simpático e que convida à leitura. Quais as dificuldades mais comuns que seus alunos encontram ao começar a ler textos filosóficos, e quais as dicas que você dá para quem deseja lê-los? Essas dificuldades inspiraram você a escrever, ou a inspiração veio de outras fontes?

G.R.: Eu acho que uma dificuldade muito geral para pessoas que estão começando a estudar filosofia consiste em adotar uma postura crítica na leitura. Com isso quero dizer que o estudo de filosofia envolve uma leitura atenta a alguns elementos que geralmente não estão presentes em outros tipos de textos (como textos literários), como argumentos, teses, objeções, distinções conceituais, etc. Estudar filosofia envolve constantemente se perguntar coisas como: “por que esses autores acham isso?”, “o que eles quiseram dizer aqui?”, “será que essa resposta resolve aquele problema?”, etc. Por causa da falta de hábito ou de treino em ler criticamente, as pessoas muitas vezes têm dificuldade de entender um texto filosófico. Mas isso, eu acho, você só aprende fazendo. Outra dificuldade diz respeito ao fato de ter que lidar com um vocabulário muito diferente do nosso vocabulário cotidiano. Isso é normal, porque a filosofia—ou melhor, a boa filosofia—pretende alcançar certo grau de rigor nas suas formulações. Isso passa pela criação de termos técnicos e de distinções, e isso pode gerar alguma estranheza aos leigos, por isso que você tem que ler filosofia tomando notas, rabiscando, destacando conceitos, sublinhando o que for importante etc.

Quanto às inspirações, eu não saberia dizer exatamente quais seriam elas. Havia uma vontade muito grande de escrever, de me manter ocupado (essa é a força que me compele sempre a participar de todos os projetos com os quais estou envolvido). Na verdade, no fundo no fundo, me parece que escrever e voltar minha atenção a problemas filosóficos (e às vezes aos problemas filosóficos que ficam na fronteira com os empíricos) é minha maneira de me manter são, de tirar um pouco minha atenção de problemas e tragédias cotidianas. A primeira versão desse livro, na verdade, tinha como alvos muito mais explícitos certas, digamos, figuras públicas que eu acredito representarem uma imbecilidade galopante que é hostil à Filosofia, e na verdade a toda vida inteligente. Eu diminuí o tom por autopreservação. Mas talvez isso mude numa eventual segunda edição a partir de 2022. Isso se meu editor Jerzy Brzozowski deixar.

3. Como foi a escolha de temas para o livro? Pode contar um pouquinho mais sobre o processo (para além do que já conta no prefácio)?

G.R.: Quando pensei em escrever um livro, tinha em mente registrar os conteúdos das minhas aulas. Mas isso foi mudando, pois, conforme avançava a escrita, eu dei uma ênfase nova a algumas questões. Um exemplo é a filosofia da linguagem e a questão da nomeação, um assunto nem sempre eu consigo trabalhar em aula. Também tirei completamente a seção de epistemologia tradicional (definição de conhecimento, ceticismo, etc.), em detrimento de uma nova seção de filosofia da ciência. Achei essa última seria mais importante para época em que a gente está vivendo, um tempo bizarro em que as pessoas pensam que tomar remédio para protozoário pode acabar com uma infecção viral. Na parte da ética eu tive mais problemas, e foi a que demorou mais para escrever, porque eu não tenho nada muito original para escrever sobre esses assuntos, e talvez também seja algo para rever no futuro. Eu admito que não tenho um único pensamento original ou interessante sobre estética, então nem me arrisquei a colocar um capítulo sobre esse tema!

4. Você acredita que existe uma “porta” certa pela qual se deve entrar quando se quer começar a  estudar filosofia ou existem várias possíveis portas de entrada? Quais dicas daria para quem quer começar a estudar?

G.R.: Eu acredito que existe uma maneira mais fácil quando se trata de uma introdução à Filosofia, que é relacionar questões de dia-a-dia ou de senso comum com problemas filosóficos. A vantagem dessa abordagem é que diminui o senso de estranheza—mas claro que nem sempre isso é possível, porque existem problemas muito técnicos e muito abstratos. Mas aí há um posicionamento meta-filosófico (que eu trato no livro), que é a continuidade da filosofia tanto com o senso comum, quanto com as questões empíricas. Há pessoas que negam essas relações, e talvez isso oriente uma preferência por ensinar e estudar filosofia de um ponto de vista estritamente histórico (tive excelentes professores que faziam isso). Mas como eu nunca fui bom nisso e nunca fiz história da filosofia com muito ânimo, prazer ou virtude, então não saberia como começar dessa perspectiva. 

Acho que uma dica primordial para qualquer material filosófico com que você se deparar é ler se perguntando ‘por quê?‘. 

5. Se quiser fazer mais algum comentário, esta é a hora 😉

Por enquanto, eu só quero agradecer pelo espaço e pela divulgação mais uma vez 😉 Um abraço! 

Eu que agradeço ao prof. Giovanni Rolla pela entrevista.

Prof. Dr. Giovanni Rolla é professor adjunto de Filosofia pelo Departamento de Filosofia da Universidade Federal da Bahia. É membro permanente do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da mesma universidade e membro fundador dos grupos de pesquisa interinstitucionais Enactive Cognition & Narrative Practices (Wollongong-AUS) e do grupo de pesquisa Cognição, Linguagem, Enativismo e Afetividade (Brasil). É doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2017), mestre (2013), bacharel (2010) e licenciado (2015) em Filosofia pela mesma universidade. Atua principalmente com filosofia da cognição, teorias da cognição corporificada, variedades de enativismo, teorias da percepção e teorias da informação.

ROLLA, GIOVANNI. Filosofia – uma introdução temática. Florianópolis: UFSC, 2021.

Natural-Born Cyborgs (Andy Clark)

This image has an empty alt attribute; its file name is 51MWMhpU8OL._SX364_BO1,204,203,200_.jpg

EN

The philosopher and cognitive scientist Andy Clark, together with the philosopher David Chalmers, is the proponent of the Extended Mind Thesis, which they released in their famous essay published in 1998. In this book, Natural-Born Cyborgs – published in 2003 – Clark proposes that we, humans, are cyborgs due to our capacity of coupling with technologies. Through our connection with all kinds of devices – not only the digital ones – we can add a wide range of resources to our cognitive systems, in a process that extends our minds through the world. Clark, therefore, advocates that the human mind is not restricted to the brain and even not to the body (and he uses a few interesting, unusual expressions to refer to these features, such as “skinbag”, “brainbound”, “naked brain” so on). Andy has published several amazing books, but this is still one of my favorites. If you like technology and are interested in human-technology relations, I am sure you will love it.

PT

O filósofo e cientista cognitivo Andy Clark, junto com o filósofo David Chalmers, é o proponente da Tese da Mente Estendida, que eles lançaram em seu famoso ensaio de 1998. Neste livro, Natural-Born Cyborgs – publicado em 2003 – Clark propõe que nós, humanos, somos ciborgues pela nossa capacidade de acoplamento com as tecnologias. Por meio de nossa conexão com todos os tipos de dispositivos – não apenas os digitais – podemos agregar uma ampla gama de recursos aos nossos sistemas cognitivos, em um processo que estende nossas mentes pelo mundo. Clark, portanto, defende que a mente humana não está restrita ao cérebro e nem mesmo ao corpo (e ele usa algumas expressões interessantes e incomuns para se referir a essas características, como “skinbag”, “brainbound”, “naked brain”). Andy publicou vários livros realmente bons, mas este ainda é um dos meus favoritos. Se você gosta de tecnologia e tem interesse nas relações entre humanos e tecnologia, tenho certeza de que vai gostar muito deste livro.

O filósofo e cientista cognitivo Andy Clark, junto com o filósofo David Chalmers, é o proponente da Tese da Mente Estendida, que eles lançaram em seu famoso ensaio de 1998. Neste livro, Natural-Born Cyborgs – publicado em 2003 – Clark propõe que nós, humanos, somos ciborgues pela nossa capacidade de acoplamento com as tecnologias. Por meio de nossa conexão com todos os tipos de dispositivos – não apenas os digitais – podemos agregar uma ampla gama de recursos aos nossos sistemas cognitivos, em um processo que estende nossas mentes pelo mundo. Clark, portanto, defende que a mente humana não está restrita ao cérebro e nem mesmo ao corpo (e ele usa algumas expressões interessantes e incomuns para se referir a essas características, como “skinbag”, “brainbound”, “naked brain”). Andy publicou vários livros realmente bons, mas este ainda é um dos meus favoritos. Se você gosta de tecnologia e tem interesse nas relações entre humanos e tecnologia, buscando uma nova abordagem para o assunto, tenho certeza de que vai gostar muito deste livro.

CLARK, ANDY. NATURAL-BORN CYBORGS. Oxford University Press, 2003.

The Promise of Artificial Intelligence (Brian C. Smith)

EN

One of the most interesting features of this book, I think, is to lead a discussion regarding the kinds of responsibilities and duties we should or should not leave up to artificial systems. Smith is not interested in making a comparison between humans and machines, as he himself makes clear in the beginning of the book, but to question the ontology that underlies the premises guiding AI in our society.

In doing so, the author offers us a rich, deep perspective of AI through a philosophical lens, encompassing ethical, technical and cognitive issues. If you are interested in questions like the features that make humans human, where we are as a society when it comes to AI, how machine learning may change our lives and what intelligence is, this book offers a great perspective and may help you think these through.

PT

Livro que recomendo para quem se interessa por AI/machine learning sob um olhar filosófico / Book I recommend to those interested in AI/machine learning through a philosophical perspective

Uma das características mais interessantes deste livro, eu acredito, é conduzir uma discussão sobre quais atividades devemos ou não deixar para a IA. Smith não está interessado em fazer uma comparação entre humanos e máquinas, como ele mesmo deixa claro no início do livro, mas em questionar a ontologia por trás das premissas que norteiam a IA em nossa sociedade.

Ao fazer isso, o autor nos oferece uma perspectiva rica e profunda da IA por meio de lentes filosóficas, abrangendo questões éticas, técnicas e cognitivas. Se você estiver interessado em questões como os recursos que tornam os humanos humanos, onde estamos como sociedade quando se trata de IA, como o aprendizado de máquina pode mudar nossas vidas e o que é inteligência, este livro oferece uma perspectiva que pode ajudá-lo a pensar sobre isso.

SMITH, BRIAN C. THE PROMISE OF ARTIFICIAL INTELLIGENCE – RECKONING AND JUDGEMENT, MIT Press, 2019