Camila Leporace
A comunicação de ciência só consegue avançar se associada ao letramento digital, especificamente o letramento em Inteligência Artificial. Por quê?
Porque comunicar ciência para a sociedade é informar, e as plataformas digitais algorítmicas contribuem muito para desinformar.
A realidade mostra-se diferente para cada indivíduo no ambiente digital. Os algoritmos moldam o conteúdo que vemos. As campanhas de desinformação muitas vezes têm como alvo usuários específicos, que podem ser mais vulneráveis. Como os usuários raramente estão cientes de como os sistemas digitais atuais funcionam, pensam que o que veem on-line é visto por outros usuários, universalmente. Uma grande distorção que abre espaço para a criação de realidades paralelas.
O microdirecionamento e a impressão digital de navegação, técnicas eficazes para direcionar a publicidade a consumidores específicos, são também úteis para a disseminação da desinformação. Embora a desinformação seja um problema antigo, as técnicas de IA abrem novas possibilidades para manipular indivíduos de forma eficaz e em escala, levantando várias preocupações éticas.
A autonomia dos usuários é ameaçada, pois eles não podem tomar decisões livremente no ambiente on-line, sem serem manipulados. Quando os algoritmos usam dados pessoais para “decidir” o que os usuários veem ou não, fechando muros em torno deles, isso é uma ameaça à privacidade e ao livre arbítrio (falo muito dessa ameaça à autonomia em meu livro, “Algoritmosfera” – expressão cunhada por mim na minha tese de doutorado).
Ameaças à autonomia dos usuários também significam ameaças à democracia. As câmaras de eco/echo chambers são ambientes nos quais os indivíduos encontram apenas crenças ou opiniões que coincidem com as suas. Nesse estado de “isolamento intelectual”, não há lugar para opiniões diversas ou diálogo. As mesmas opiniões, hábitos e pontos de vista são reforçados, reiteradamente.
Por isso são grandes os desafios digitais para a comunicação, especialmente naquela que diz respeito à ciência; e é com letramento digital que se fará melhor difusão científica no Brasil.